Uma das consequências da globalização das relações humanas é a hipercomunicação. A sociedade atual já se habituou à intensa troca de mensagens, informações e imagens. No entanto, apesar dos benefícios econômicos, sociais e culturais que a ampla circulação de dados propiciou à sociedade, o mundo virtual propiciou no nascimento de novas formas de agressão e lesão. Diariamente, são divulgados casos de plágio, invasão de aparelhos celulares, calúnia, difamação, injúria, divulgação de fotos íntimas, perfis fakes, entre outras infinitas situações que geram prejuízos tanto materiais como à psique humana.
Com a intenção de regular as interação do mundo virtual, em 2014, o Brasil aprovou o Marco Civil da Internet, que estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no país. Trata-se de um grande avanço a regulação do mundo virtual. Porém, por ser um regramento novo no país, alguns temas são controvertidos e os Tribunais Superiores ainda estão debatendo sua adequada interpretação.
Uma dessas questões que ainda não possui entendimento consolidado é: os provedores de conteúdo de internet devem responder pelos danos causados por conteúdo ofensivo publicado por terceiros em suas páginas, caso não tomem as devidas providências quando denunciados?
O provedor de conteúdo é toda a pessoa física ou jurídica que possibilita a seus usuários inserirem informações na Internet através das páginas nele hospedadas. Facebook, Twiter e Instagram são exemplos de empresas que são provedoras de conteúdo, pois, através de seus aplicativos, pessoas podem publicar mensagens e imagens.
Em regra, os provedores de conteúdo não são obrigados a controlar, previamente, o conteúdo postado por seus usuários. Contudo, através dos canais de denúncia, por controle posterior, podem bloquear as publicações que tenham o cunho ofensivo e possam causar lesão aos direitos de terceiros.
No entanto, o Marco Civil da Internet, com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, definiu que os provedores só podem retirar conteúdo gerado por terceiro, após ordem judicial prévia e específica. Deste modo, ante toda a crítica dos especialistas do tema, o Supremo Tribunal Federal (STF) está analisando a constitucionalidade ou não de tal regra.
A ideia apresentada pelo Marco Civil da Internet é permitir a livre manifestação e debate de ideias. Entretanto, a nosso ordenamento jurídico também é composto de outras normas como de Direito Penal, de Proteção à Criança e ao Adolescente e de Responsabilidade Civil que devem ser respeitadas. Logo, não seria justo permitir ofensa ou violência à imagem de uma criança ou de um determinado grupo social, mesmo que seja durante um período curto, até que se obtenha a ordem judicial específica para que o provedor de conteúdo retire a publicação.
Dessa forma, o STJ está adotando uma interpretação restritiva do Marco Civil da Internet. Ou seja, para o Tribunal, em se tratando de conteúdo difamatório à criança ou adolescente, o provedor de conteúdo, após receber a denúncia em seus canais próprios e nada fizer a respeito, será responsabilizada pelos danos morais causados à vítima. A proteção da honra, da imagem e da privacidade não pode ser condicionada a uma prévia ordem judicial, à custa de evidente prejuízo à parte hipossuficiente, que não possui os meios eficazes para impedir a circulação do conteúdo ofensivo. Portanto, cabe à página adotar providências que visem minimizar os efeitos do ato danoso praticado por terceiro.